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Encontro de Final de Ano – JASBRA/PE
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A Gazeta de Longbourn apresenta: Northanger Abbey, Angels and Dragons
For, what is order without common sense, but Bedlam’s front parlor? What is imagination without common sense, but the aspiration to out-dandy Beau Brummell with nothing but a bit of faded muslin and a limp cravat? What is Creation without common sense, but a scandalous thing without form or function, like a matron with half a dozen unattached daughters?
And God looked upon the Creation in all its delightful multiplicity, and saw that, all in all, it was quite Amiable.
De todos os livros da Austen, A Abadia de Northanger é, muito provavelmente, o que melhor se presta para o gênero dos mash-ups – afinal, ele em si já é uma espécie de releitura do romance gótico, satirizando os clichês envolvidos em sua composição. Assim é que, quando procurava algum título para encaixar na minha quota austeniana do mês e de quebra comemorar o dia das bruxas, decidi ir atrás de algum livro que brincasse com a história de Miss Morland.
Devo dizer que foi a escolha mais acertada que eu poderia ter feito. Eu cheguei a me divertir com Orgulho e Preconceito e Zumbis, especialmente com os trocadilhos (que nunca descobri como ficaram na versão em português) – o autor não se leva a sério e a coisa toda é insana -, mas torci o nariz para Razão e Sensibilidade e Monstros do Mar e, mais recentemente, para Emma and the Vampires. Northanger Abbey, Angels and Dragons, de todos esses foi, contudo, o que melhor soube explorar não apenas as lacunas em que os elementos sobrenaturais são inseridos, mas o próprio humor da história.
Eu soltei gargalhadas infindas durante quase toda a primeira metade do livro. Os primeiros capítulos, em que somos apresentados a Catherine são um tesouro (é depois de bater com a cabeça que Cathy passa a ver e conversar com anjos, embora para as pessoas ao seu redor, pareça que ela está tendo animadas discussões com a mobília…) e o que a Nazarian fez com o Torpe Thorpe foi, francamente… um golpe de gênio. E ela consegue isso respeitando o texto original, o espírito dos personagens que Austen criou.
O livro perde um pouco o ritmo a partir do momento em que é introduzido o General Tilney e a ação sai de Bath para Northanger. O plot envolvendo os dragões me pareceu desnecessário, especialmente pelas consequências que teve na confissão de Henry, ao final (fora que essa história de ‘dragão do amor’ me fez revirar os olhos…), mas eu gostei da aparição fantasmagórica da senhora Tilney.
De uma maneira geral, eu me diverti bastante com o livro, dei muitas risadas imaginando a Catherine conversando com seus anjos desastrados… imaginando como é que ela explicaria a situação para o Henry quando chegasse a hora e se ele acreditaria que ela via coisas que não são desse mundo ou a mandaria para o Bedlam. O final foi um tanto abrupto, mas ainda assim, eu recomendo Northanger Abbey, Angels and Dragons para os leitores não puristas da Austen – sem deixar de observar, obviamente, que o original é cem vezes superior.
A Gazeta de Longbourn apresenta: A Abadia de Northanger
“Não vou adotar esse mesquinho e grosseiro costume, tão comum entre romancistas, de degradar com sua censura desdenhosa os próprios trabalhos cujo número eles mesmos fazem crescer, unindo-se a seus piores inimigos em dar os mais agressivos epítetos a tais obras, sem sequer permitirem que elas sejam lidas por sua própria heroína, que, se por acidente lhe cair nas mãos um romance, decerto folheará suas insípidas páginas com repulsa. Mas ai! Se a heroína de um romance não for apadrinhada pela heroína de outro, de quem poderá esperar proteção e atenção? Não posso aprovar tal coisa. Deixemos aos críticos insultar à vontade tais efusões de imaginação, e a cada novo romance lançar seus surrados ataques contra o lixo que hoje faz gemerem as prensas. Não abandonemos uns aos outros; somos um corpo ferido. Embora a nossa produção tenha proporcionado mais amplo e autêntico prazer do que as de qualquer outra corporação literária do mundo, nenhuma espécie de composição foi mais vituperada. Por orgulho, ignorância ou moda, nossos inimigos são quase tantos quantos nossos leitores. E enquanto o talento do nongentésimo compilador da História da Inglaterra ou do homem que reúne e publica num livro algumas dúzias de linhas de Milton, Pope e Prior, com um artigo do Spectator, e um capítulo de Sterne, são elogiados por mil plumas, há um desejo quase universal de vilipendiar e desvalorizar o trabalho do romancista, e rebaixar obras que têm apenas o gênio, a inteligência e o bom gosto para recomendá-las. ‘Não sou um leitor de romances… Raramente folheio romances… Não vá imaginar que leio muitos romances… Para um romance, está muito bom.’ Essa é a cantilena de sempre. ‘E o que anda lendo, Senhorita…? ‘Ah! É só um romance!’, responde a mocinha, enquanto larga o livro com afetada indiferença ou momentânea vergonha. ‘É só Cecília ou Camilla ou Belinda’; ou, em suma, só alguma obra em que se exibem as maiores faculdades do espírito, em que o mais completo conhecimento da natureza humana, o mais feliz traçado de suas variedades, as mais vivas efusões de inteligência e humor são oferecidos ao mundo na linguagem mais seleta.”
A Abadia de Northanger é, sem sombra de dúvidas, o livro mais divertido e juvenil das obras que nos foram legadas por Jane Austen. Não à toa, afinal, embora tenha sido publicado postumamente, foi o primeiro romance que ela escreveu.
Não há a sutileza do texto de Orgulho e Preconceito ou Emma, nem tantos personagens ambiguamente fascinantes, como Wickham ou Willoughby… embora haja já certos traços desses vilões no general-pai e capitão-filho Tilney. A Abadia de Northanger é abertamente e sem pejo, uma grande brincadeira, uma crítica e uma homenagem ao inteiro gênero do romance gótico.
Há uma ingenuidade refrescante em sua heroína – que caminha todos os passos da heroína sem perceber o que está fazendo -; um herói simpático, com um olho muito bom para musselinas e nem de longe tão intenso quanto Mr. Darcy ou o Capitão Wentworth (mas nem por isso menos apaixonante); e um vilão caricatural que gosto de chamar em minha cabeça de torpe Thorpe.
Eu vou confessar que Henry Tilney é um dos meus protagonistas favoritos da Austen. O primeiro lugar é do Capitão, obviamente, mas creio eu que se fosse para escolher na vida real, fora dos romances, eu preferiria um Tilney a um Wentworth. Como já disse antes, ele não é intenso e passional, mas tem um senso de humor delicioso, maneiras encantadoras; ele sabe rir de si mesmo, sabe provocar e flertar num mesmo fôlego, é, enfim, absurdamente charmoso.
E, a despeito de ter o mais complicado conflito familiar de todos os romances austenianos – a breve afirmação que ele faz sobre o papal do pai no definhar da mãe diz muito sobre o que ele pensa sobre o assunto – Tilney é também o mais bem resolvido de seus mocinhos.
Catherine, por sua vez, desperta em mim sentimentos de tia – tenho uma vontade enorme de apertar as bochechas dela e exclamar ‘mas você é uma fofa mesmo!’. Embora muito inocente, a jovem senhorita Morland tem grande potencial para se tornar uma criatura de bom senso, sabendo julgar o torpe Thorpe pelo canastrão que ele é, reconhecendo as vantagens de associação com a senhorita Tilney (não apenas pelo acesso que pode ter ao irmão, mas por um desejo sincero de amizade e admiração), sabe rir e chamar a atenção para os disparates com que Henry freqüentemente a provoca.
O único problema que Catherine tem de fato é essa ingenuidade que a faz ser presa tão fácil para a (detestável, vã e inconveniente) Isabella Thorpe… e uma imaginação febril que a faz enxergar chifre em cabeça de cavalo.
Mas tudo bem, ela continua adorável de qualquer ângulo que se olhe e continuo com complexo de Felícia querendo apertá-la atéeeeeeeeeee estourar.
A Abadia de Northanger é, enfim, um livro para se ler sorrindo (às vezes gargalhando), com personagens que são incrivelmente fáceis de se amar e uma veia paródica nem um pouco sutil – mas simplesmente deliciosa, já guardando as marcas do estilo que consagraria Austen na História.
A Gazeta de Longbourn apresenta: Lendo Lolita em Teerã
Perguntei aos meus alunos em nosso primeiro dia de aula, o que eles achavam que a ficção poderia proporcionar, porque, afinal, alguém deveria se preocupar em ler ficção. Foi um modo diferente de iniciar uma aula, mas consegui prender a atenção da turma. Expliquei que iríamos ler e discutir diferentes autores durante aquele semestre, mas que todos os autores escolhidos tinham a subversão como algo em comum. Alguns deles, como Gorki e Gold, eram abertamente subversivos em seus objetivos políticos; outros como Fitzgerald e Mark Twain, eram, na minha opinião, ainda mais subversivos, embora isso não fosse óbvio. Disse aos alunos que frequentemente voltaríamos ao termo subversão, pois minha compreensão desse termo era diferente da sua definição habitual. Escrevi no quadro uma das minhas frases favoritas do pensador e filósofo alemão Theodor Adorno: ‘a mais elevada forma de moralidade é não se sentir em casa em sua própria casa’. Expliquei-lhes que a maioria das grandes obras da imaginação pretendia nos fazer sentir como estrangeiros em nossa própria casa. A melhor ficção sempre nos força a questionar aquilo que temos como certo. Ela questiona as tradições e as expectativas, quando estas parecem ser imutáveis. Disse-lhes que gostaria que eles observassem de que modo essas obras os perturbavam, produziram desconforto, fizeram com que analisassem o mundo à sua volta, como Alice no país da maravilhas, através de diferentes olhares.
Alguns anos atrás, o pessoal da JASBRA/PE foi chamado para uma entrevista com o Jornal do Commercio e, na ocasião, o jornalista que nos encontrou citou esse livro como sua porta de entrada para o mundo de Austen.
Foi o que bastou para me deixar curiosa, e ele entrou na minha lista de futuras leituras que é algo assim como as histórias de Sherazade (que, aliás, é lembrada na narrativa), que nunca se acabam, mesmo após mil e uma noites…
Lendo Lolita em Teerã é o relato real de uma professora de literatura inglesa no Irã em plena Revolução, no início da década de 80 – uma época bastante perigosa para se ter idéias próprias e pior ainda para ser mulher no Irã.
O livro é dividido em quatro partes, cada qual debatendo um autor: Nabokov, Fitzgerald, Henry James e Jane Austen – e também as experiências de Nafisi como professora tanto na Universidade de Teerã como em aulas secretas e particulares com um pequeno grupo de alunas.
Lembre-me bastante, enquanto lia, de Conversas Sobre Jane Austen em Bagdá. A situação das autoras dos dois livros é muito parecida, ainda que Nafisi fale da década de 80 e da guerra entre Iraque e Irã, enquanto Witwit viva o cotidiano da invasão americana de 2003 ao Iraque.
Os diálogos (emails e cartas) de Witwit com sua correspondente londrina são bastante pessoais e nisso o título do livro é um tanto enganador; Nafisi, por outro lado, se concentra mais naquilo que representa o ‘ler Lolita em Teerã’: a leitura e debate das obras que são analisadas é um ato de revolta, de desafio ao regime autoritário que tenta de todas as formas sufocar qualquer tipo de pensamento independente.
Os debates que Nafisi propõem são excelentes e a reação dos alunos – mesmo aqueles que parecem condenar suas tentativas de ensinar não apenas literatura, mas também senso crítico – é magnífica: o julgamento que se faz de O Grande Gatsby é uma cena quase surreal e demonstra muito bem o poder da palavra, o impacto que grandes obras literárias podem ter; o debate que se segue entre um moralismo ultraconservador e um pensamento mais liberal e crítico demonstra muito bem aquilo que Nafisi quis dizer com essa obra.
Uma resistência literária em que um pequeno grupo se reúne para ler e debater obras proibidas pode parecer muito pouco diante da gravidade dos fatos que a autora apenas toca ao longo de Lendo Lolita em Teerã – se por sorte ou outras questões, o fato é que ela não se expôs tanto quanto algumas de suas alunas e colegas e as represálias que sofre são relativamente brandas em comparação com o que poderiam ter sido.
Contudo, não é pouco o que Nafisi fez. Ela deu aos seus alunos a possibilidade de se fazer ouvir, de conhecer, de criticar. Ela deu esperança e também um exemplo a que aspirar. Em tempos bastante sombrios, ela tentou fazer sua parte, ser um porto seguro, uma réstia de luz. E ao final das contas, para que possa haver revolução, é necessário começar por algum lugar, não?
Então, por que não começar pelos livros?
A Gazeta de Longbourn apresenta: For You Alone
I can listen no longer in silence. I must speak to you by such means as are within my reach. You pierce my soul. I am half agony, half hope.
A história desse segundo volume se inicia logo após o acidente de Louisa Musgrove em Lyme. Wentworth se vê agora às voltas com a ideia de que está comprometido por uma questão de honra, a pedir Louisa em casamento, isso logo após se dar conta de que continua amando Anne e que ela é exatamente tudo o que ele deseja numa mulher.
Para não se enrolar ainda mais na armadilha que ele mesmo armou para si, o capitão parte para visitar seu irmão e esperar que as coisas se assentem. Lá ele tem um vislumbre da felicidade conjugal do mais velho dos irmãos Wentworth e passa o tempo a se torturar com aquilo que poderia ter tido se não tivesse sido tão rancoroso e tão apressado em julgar sua querida Anne.
Obviamente, como todo mundo que leu o original Austeniano, ele será resgatado de seu imbróglio e terminará com o caminho livre para partir para Bath e reencontrar Anne – e para escrever uma das cartas de amor mais apaixonadas de toda a literatura. Claro que antes que isso aconteça, ainda haverá um longo caminho de desentendimentos, ciúmes e esperança com que lidar.
A Kaye saiu-se muito bem como sua reedição da história pelo ponto de vista do Wentworth – ela trabalha o contexto da época, as questões do final da guerra e das consequências de tal fato para os homens da marinha. O capitão ganha profundidade, uma existência para além de sua corte a Anne e ela faz isso de maneira muito crível.
A única coisa que me desagradou foi o final, que dá uma curva tá abrupta daquilo que se espera dos personagens de Austen que me deixou até tonta – primeiro pela súbita mudança de ponto de vista, com a Anne como narradora, segundo, por Greta Green, que faz mais o estilo Lydia Bennet que Anne Elliot.
É uma única ressalva numa obra que, de outra maneira, tinha tudo para receber um ‘excelente’. Ainda assim, para os amantes de Austen e admiradores do valoroso capitão, é uma boa recomendação.
A Gazeta de Longbourn apresenta: None But You
Eight years ago, when he had nothing but his future to offer, Frederick Wentworth fell in love with Anne Elliot, the gentle daughter of a haughty, supercilious baronet. Sir Walter Elliot refused to countenance a marriage, and Anne’s godmother, Lady Russell, strongly advised Anne against him. Persuaded by those nearest to her, Anne had given him up and he had taken his broken heart to sea. When Jane Austen’s Persuasion opens in the year 1814, Frederick Wentworth, now a famous and wealthy captain in His Majesty’s Navy, finds himself back in England and, as fate would have it, residing as a guest in Anne’s former home. Now, it is the baronet who is in financial difficulties, and Anne exists only at her family’s beck and call. For eight long years, Frederick had steeled his heart against her. Should he allow Anne into his heart again, or should he look for love with younger, prettier woman in the neighbourhood who regard him as a hero?
Para quem não sabe, Persuasão é meu romance favorito da Austen – Mr. Darcy que me perdoe, mas fica difícil competir com um capitão da marinha com uniforme completo e enorme talento para escrever cartas de amor.
Assim é que foi com empolgação que me lancei a ler None But You, narrando os eventos de Persuasão sob o ponto de vista do Capitão Wentworth – começando bem antes de sua chegada a Kellynch Hall, ainda ao mar, na expectativa de deixar seu navio uma vez que a guerra acabou.
Acompanhamos Wentworth em seus exercícios diários junto à sua tripulação (e esses momentos me lembraram por demais de Mestre dos Mares), seu encontro com Benwick para revelar a morte de Fanny, suas lembranças de Anne quando do primeiro noivado ‘oito anos atrás’.
A história aqui vai até a queda de Louise em Lyme, continuando num segundo volume (de que falarei mês que vem). Há bastante espaço para desenvolvimento do personagem, não apenas dentro do romance com Anne, mas como um todo. O Wentworth de Susan Kaye é extraordinariamente humano, passional, verdadeiro.
Essa primeira parte da história traz um capitão mais amargo, incapaz de se libertar de seus antigos rancores, a todo tempo julgando e observando sua antiga amada – sem querer enxergar que todo o seu interesse na jovem é prova de que seu afeto permanece.
É uma narrativa que te prende – eu não larguei do livro enquanto não o terminei e imediatamente ao final emendei no segundo volume, virando noite para chegar ao final da história. De uma forma geral, None but You me lembrou do desenvolvimento de Mr. Darcy na trilogia de Pamela Aidan, em todos os seus melhores momentos. Kaye respeita a obra original, e é capaz de uma recriação histórica verossímil – exceto, talvez, pelos encontros a sós na juventude de Wentworth e Anne (o que desculpamos em nome do romance).
Melhor parte pra mim, contudo, foi a Sophie. Eu ADORO a Sophie e gostaria muito de ver os eventos de Persuasão sob o ponto de vista dela. Na impossibilidade de tal releitura, resigno-me com as interações dela com o irmão caçula.
Agora, rumo a segunda e melhor parte do romance: o capitão em Bath tentando reconquistar sua amada!
Persuasão em debate – Clube do Livro da Saraiva em parceria com a JASBRA
“Persuasão foi o último romance completo que Austen escreveu, tendo sido publicado postumamente. Embora não seja tão famoso quanto o clássico Orgulho e Preconceito, é talvez o mais passional e subversivo de seus romances. Uma história sobre perdão e segundas chances, com uma das mais belas e apaixonadas cartas da literatura. Venha ter a alma transpassada, parte agonia e parte esperança com o clube do livro saraiva!”
Encontro JASBRA-PE: discutindo Sherlock Holmes
Domingos – Leonardo Ferraz – Lendo A Abadia de Northanger
Leonardo é pernambucano e membro da JASBRA-PE. Tive o prazer de conhecer o Duda (ops Leonardo) no IV Encontro Nacional da JASBRA.
Lendo A Abadia de Northanger
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